O romance Os Espiões, livro que Luis Fernando Verissimo já concluiu que deve ser publicado em dezembro pelo selo Alfaguara, da editora Objetiva, é a sexta narrativa longa do autor. Curiosamente, é o primeiro livro que o próprio Verissimo considera “seu”, do início ao fim.
A proposição parece estranha mas a explicação é simples: é a primeira vez que Verissimo escreve um romance por impulso próprio. As demais narrativas longas do autor (O Jardim do Diabo, O Clube dos Anjos, Borges e os Orangotangos Eternos, O Opositor e A Décima Segunda Noite) nasceram todas ou de provocações ou de encomendas das editoras.
– Esse aí eu mesmo resolvi me encomendar – comenta o escritor.
Como é praxe na obra de Verissimo, o novo livro terá um registro que trabalha a meio caminho entre a paródia e o exercício da literatura de gênero – desta vez, menos o policial propriamente dito, trabalhado em quase todos os outros romances. Agora, Verissimo mira em um ramo particular da literatura de mistério: o thriller de espionagem praticado por seu ídolo John Le Carré. Mas, sendo Verissimo, é claro que o escritor subverte o gênero.
– É meio difícil de resumir, é uma história de espionagem que não se passa no mundo da alta espionagem e sim uma cidade fictícia do interior do Estado – conta o autor, que, é óbvio, imprimiu a marca de seu humor pessoal à obra. – É um pouco de paródia e ao mesmo tempo não é. O livro tem humor, mas acaba mal. É a história de um cara que trabalha numa editora e um dia recebe um original de uma mulher do Interior do Estado, e ele se apaixona por ela por causa do texto, e sai à procura para tentar descobrir quem é.
Outra vez, portanto, Verissimo escreve um romance que tem no próprio ato narrativo seu eixo temático. Seus romances são sempre conduzidos na primeira pessoa, e jogam em maior ou menor grau com as fronteiras entre o personagem encarregado de contá-la e o autor, Verissimo, que concede a ele tal missão. A metalinguagem e a presença da literatura como tema e pretexto é recorrente.
Em O Jardim do Diabo, o protagonista é um escritor de livros baratos (em mais de um sentido) de aventura. Em O Clube dos Anjos, o último sobrevivente da série de assassinatos cometidos à mesa é justamente o narrador, que tem a certeza de haver sido deixado para trás para recapitular a trama em que se viu envolvido. O narrador de Borges e os Orangotangos Eternos é o tradutor dos textos do argentino para a revista Mistério Magazine, publicada pela Editora Globo nos anos 1940 – elementos, como se vê, semelhantes aos da trama de Os Espiões.
O livro sai pela mesma editora Objetiva que publicou não apenas os romances mais recentes como também tem reeditado a sua obra como cronista e contista. Ofício ao qual Verissimo atribui, de brincadeira, também a extensão concisa de suas narrativas. Os Espiões deve ficar com umas 150 páginas.
Deu no blog Meia Palavra:
Considerado pelo autor seu primeiro romance – o primeiro escrito por vontade própria, ao menos – “Os Espiões” é praticamente um metalivro. Escrito em primeira pessoa, por um personagem funcionário de uma editora, a história é construída em torno de um manuscrito escrito em letras trêmulas, cujo título é Ariadne. Com uma florzinha no lugar do pingo no i.
O editor, um bêbado inveterado, que sofre da síndrome da segunda-feira, logo se vê intrigado por um texto em prosa, sem vírgulas e com uns poucos erros de grafia, que mais parece uma carta de suicídio e, além de indicar o livro para seu chefe, resolve descobrir quem é a autora do livro, e sua história. Apaixonado por John Le Carré, o protagonista leva a história de Ariadne para a mesa de bar, onde se inicia uma verdadeira missão de salvamento. A Operação Teseu. E isso é o máximo que posso falar sobre a história sem estragar as várias surpresas que o LFV deixou no texto.
Me agradou, principalmente, a maneira como ele constrói a história de Ariadne, se apoiando em algumas boas frases, as referências ao mito grego, a obsessão do editor por um texto e uma foto, bem como sua mudança de comportamento e de hábitos por conta disso. É um livro repleto de detalhes, todos eles importantes.
Extrapolando um pouco, esta obra fala da obsessão do leitor, que se vê preso à linha de Ariadne no caminho inverso, para dentro do labirinto. Fala do encanto que a palavra escrita causa em nós, leitores obsessivos, e de como, às vezes, vamos muito além do que está escrito e imaginamos uma infinidade de “E se…”, como todas as variações possíveis. E como seria se levássemos um desses “E se…” às ultimas consequencias.
E tudo bem, eu confesso. A resenha de hoje é um relato de fã. Incondicional. Desde a primeira crônica. E para comemorar que esse ano eu conheci -ainda que timidamente – o grande Luis Fernando Verissimo.
Os Espiões (Luis Fernando Verissimo)
Editora Objetiva (selo Alfaguara)
Ficção
ISBN 9788560281992
144 páginas
R$ 31,90